Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Soldado velho deu baixa do
Serviço do Exército por não servir mais para o trabalho. O soldo que recebia em
recompensa de muitos anos de serviço foi um cruzado. Ora, o que faz ele?
Comprou um pato e saiu a revendê-lo. Chegando perto de uma casa, sai-lhe uma
criada a comprar o pato. Ele disse que o custo era de dois cruzados; ela vai
falar à patroa, que manda vir o pato e também mandou pagá-lo. O soldado, porém,
não saiu mais do portão. Dentro de certo espaço de tempo chega um frade para
jantar na casa e pergunta o que estava aí fazendo. O soldado velho que fisgou alguma
coisa, disse que estava à “espera” do pagamento de um pato que tinha vendido
naquela casa. O frade perguntou quanto era; ele disse o custo de dois cruzados.
O religioso puxa do bolso da batina o dinheiro e paga. Dispõe-se depois a
entrar na casa; o soldado acompanha, juntos entram. Chegando na sala o frade,
que parecia muito íntimo da casa, puxou, e sentou-se numa cadeira; o militar
também faz o mesmo. A dona da casa vendo o frade entrar acompanhado com aquele
homem desconhecido ficou furiosa, sem saber o que devia fazer e sem coragem de
perguntar ao frade que homem era aquele. O eclesiástico não lhe dizia nada e
assim vão, até chegar a hora do jantar a que não faltaria o pato de cabidela.
O frade tinha lugar na mesa; o
soldado velho também faz o mesmo. A dona da casa estava furiosa, mas aceitava a
situação fazendo das tripas coração.
Já estava a terminar o jantar,
quando bateram à porta. Era o dono da casa. Estava tudo perdido. O que faz a
mulher: tranca o frade e o soldado em uma alcova. O marido não saiu mais e a
mulher cada vez mais ficava amedrontada. Chega a noite. O frade não tinha dado
até ali uma palavra; o soldado velho também; mas quando foi ali pelas dez horas
da noite, o soldado velho, vendo que todos estavam já agasalhados, principiou
uma conversação com o frade.
Pediu-lhe este que não falasse
ali, mas o militar continuou a falar.
O frade gratificou-lhe com um
conto de réis para que ele não mais falasse. Recebeu o dinheiro o soldado
velho, mas logo de novo começou a dizer que no dia que comia pato não podia
ficar calado. Deu-lhe o frade um outro conto de réis ficando sem mais um vintém.
O soldado velho, pois, continuou a falar. O companheiro, para ver se ele se
calava, deu-lhe da batina de sede.
O soldado velho teimava em
continuar a dizer que no dia que comia pato não podia estar calado. O frade já
lhe pedia pelo amor de Deus que não falasse mais, pois se tal o não fizesse,
ficariam desgraçados. O dono da casa certamente acordaria e era capaz de
matá-los.
O soldado velho não queria saber
de nada, o seu desejo era só de falar. O frade vendo que não tinha mais o que
dar despiu-se de toda roupa e entregou-a ao soldado velho para que ele não
falasse mais. Já sendo meia-noite na cadeia o sentinela solta o brado de
alerta, o soldado velho ouviu e produziu um outro formidável brado. O frade,
com medo, meteu as mãos na porta e saiu nu. Soldado velho que ainda não estava
vestido com batina acompanhou o frade que pulou uma janela. O dono da casa pula
atrás do frade e dá-lhe um tiro. O soldado velho pula atrás do dono da casa e o
prende. O homem que era um homem de grande reputação não quis sujeitar-se à
prisão, mas o soldado velho não queria saber de nada. Estava preso e bem preso,
pois ele era o mandante e tinha que cumprir o serviço, tanto mais que o dono da
casa tinha dado um tiro num homem. Não podia de maneira alguma soltá-lo. O dono
da casa, vendo a revolução do soldado velho, e que tinha de ir mesmo à presença
das autoridades, ele que era muito conhecido e respeitado por todos, propôs ao
militar, se ele o soltasse, dar-lhe doze contos de réis. Soldado velho aceitou,
mas com as condições do dono da casa mandar a sua mulher contar e trazer ali,
onde estavam. O homem chamou a mulher e mandou que contasse doze contos de réis
com toda pressa e trouxesse. Assim foi feito. Soldado velho, que só vencia um
cruzado por mês, saiu da aventura com catorze contos e quatro cruzados e a
batina do frade e todos os paramentos do frade.
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