Astúcias de um marido
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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CAPÍTULO
1
Não me admira, dizia um poeta antigo, que um
homem case uma vez; admira-me que, depois de viúvo, torne a casar. Valentim
Barbosa achava-se ainda no primeiro caso e já compartia a admiração do poeta
pelos que se casavam duas vezes.
Não é que a mulher dele fosse um dragão ou
uma fúria, uma mulher como a de Sócrates; ao contrário, Clarinha era meiga,
dócil e submissa, como uma rola; nunca abrira os lábios para exprobrar ao
marido uma expressão ou um gesto. Mas que faria então a desgraça de Valentim? É
o que eu vou dizer aos que tiverem a paciência de ler esta história até o fim.
Valentim fora apresentado em casa de Clarinha
pelo correspondente de seu pai no Rio de Janeiro. Era um rapaz de vinte e oito
anos, formado em direito, mas suficientemente rico para não usar do título como
meio de vida.
Era um belo rapaz, no sentido mais elevado da
palavra. Adquirira nos campos riograndenses uma robustez que lhe ia bem com a
beleza máscula. Tinha tudo quanto podia seduzir uma donzela: uma beleza varonil
e uma graça de cavaleiro. Tinha tudo quanto podia seduzir um pai de família:
nome e fortuna.
Clarinha era então uma interessante menina,
cheia de graças e prendas. Era alta e magra, não da magreza mórbida, mas da
magreza natural, poética, fascinante; era dessas mulheres que inspiram o amor
de longe e de joelhos tão impossível parece que se lhes possa tocar sem
profanação. Tinha um olhar límpido e uma fisionomia insinuante. Cantava e
tocava piano, com a inspiração de uma musa.
A primeira vez que Valentim a viu, Clarinha
saía da cama, onde a detivera, durante um mês, uma febre intermitente. Um rosto
pálido e uns olhos mórbidos deixaram logo o advogado sem saber de si, o que
prova que não havia nele uma alma de lorpa.
Clarinha não se inspirou de nada; gostava do
rapaz, como o rapaz gostara de outras mulheres; achou-o bonito; mas não sentiu
amor por ele.
Valentim não teve tempo nem força para
analisar a situação. Ficou abalado pela menina e decidiu-se a apresentar-lhe as
suas homenagens. Não há ninguém que tome mais facilmente intimidade do que um
namorado. Valentim, aos primeiros oferecimentos do pai de Clarinha, não
hesitou; volveu à casa da moça e tornou-se o mais assíduo frequentador.
Valentim conhecia a vida; metade por ciência,
metade por intuição. Tinha lido o Tratado
de paz com os homens, de Nicole, e reteve estas duas condições a que o filósofo
de Port Royal reduz o seu sistema: não opor-se às paixões, não contrariar as
opiniões. O pai de Clarinha era doido pelo xadrez e não via salvação fora do
partido conservador; Valentim fustigava os liberais e acompanhava o velho na
estratégia do rei e dos elefantes. Uma tia da moça detestava o império e a
constituição, chorava pelos minuetos da corte e ia sempre resmungando ao teatro
lírico; Valentim contrafazia-se no teatro, dançava a custo uma quadrilha e
tecia loas ao regime absoluto. Enfim, um primo de Clarinha mostrava-se ardente
liberal e amigo das polcas; Valentim não via nada que valesse uma polca e um
artigo do programa liberal.
Graças a este sistema era amigo de todos e
tinha seguro o bom agasalho.
Mas daqui resultavam algumas cenas divertidas.
Por exemplo, o velho surpreendia às vezes uma
conversa entre Ernesto (o sobrinho) e Valentim a respeito de política: ambos
coroavam a liberdade.
— Que é isso, meu caro? Então segue as
opiniões escaldadas de Ernesto?
— Ah! respondia Valentim.
— Dar-se-á caso que também pertença ao
partido liberal?
— Sou, mas não sou...
— Como assim? perguntava Ernesto.
— Quero dizer, não sou mas sou...
Aqui Valentim tomava a palavra e fazia um
longo discurso tão bem deduzido que contentava as duas opiniões. Dizem que é
isto uma qualidade para ser ministro.
Outras vezes era a tia quem o surpreendia no
campo contrário, mas a habilidade de Valentim triunfava sempre.
Deste modo, concordando em tudo, nas opiniões
como nas paixões, — apesar das pesadas obrigações de jogar o xadrez e ouvir a
velha e as histórias do outro tempo, — Valentim conseguiu na casa de Clarinha
uma posição proeminente. Sua opinião tornou-se decisiva em tudo quanto
concernia aos projetos do velho pai. Baile onde não fosse Valentim não ia a
família. Dia em que este não fosse visitá-la podia dizer-se que corria mal.
Mas o amor caminhava ao lado da intimidade, e
até por causa da intimidade. Cada dia trazia a Valentim a descoberta de uma
nova prenda no objeto do seu culto. A moça estava na mesma situação do primeiro
dia, mas era tão amável, tão doce, tão delicada, que Valentim, tomando a nuvem
por Juno, chegou a acreditar que era amado. Talvez mesmo Clarinha não fosse
completamente ingênua no engano em que fazia cair Valentim. Um olhar e uma
palavra não custa, e é tão bom alargar o círculo dos adoradores!
O pai de Clarinha descobriu o amor de
Valentim e aprovou-o logo antes da declaração oficial. Aconteceu o mesmo à tia.
Só o primo, apenas desconfiou, declarou-se interiormente em oposição.
Para que encobri-lo mais? Não sou romancista
que me alegre com as torturas do leitor, pousando, como o abutre de Prometeu,
no fígado da paciência sempre renascente. Direi as coisas como elas são:
Clarinha e Ernesto amavam-se.
Não era recente esse amor: datava de dois
anos. De três em três meses Ernesto pedia ao velho a mão da prima, e o velho
recusava-lhe dizendo que não dava a filha a quem não tinha eira nem beira. O
moço não pôde arranjar um emprego, apesar de todos os esforços; mas no fim do
período regular de três meses voltava à carga para receber a mesma recusa.
A última vez que Ernesto renovou o pedido, o
pai de Clarinha respondeu que se lhe ouvisse mais falar nisso fechava-lhe a
porta. Proibiu à filha que falasse ao primo, e comunicou tudo à irmã, que
julgou oportuna a ocasião para obrigá-lo a suspender a assinatura do teatro
lírico.
Ir à casa de Clarinha sem poder falar-lhe era
cruel para o jovem Ernesto. Ernesto, portanto, retirou-se amigavelmente. No fim
de algum tempo voltou declarando estar curado. Pede a fidelidade que manifeste
neste ponto ser a declaração de Ernesto a mais séria do mundo. O pai acreditou,
e tudo voltou ao seu antigo estado; sim, ao seu antigo estado, digo bem, porque
o amor que Ernesto cuidara extinto reviveu à vista da prima. Quanto a esta,
ausente ou presente, nunca esqueceu o amante. Mas a vigilância prudente do pai
pôs os nossos dois heróis de sobreaviso, e ambos passaram a amar em silêncio.
Foi pouco depois disto que apareceu Valentim
em casa de Clarinha.
Aqui devo eu fazer notar aos leitores desta
história, como ela vai seguindo suave e honestamente, e como os meus
personagens se parecem com todos os personagens de romance: um velho maníaco;
uma velha impertinente, e amante platônica do passado; uma moça bonita
apaixonada por um primo, que eu tive o cuidado de fazer pobre para dar-lhe
maior relevo, sem, todavia, decidir-me a fazê-lo poeta, em virtude de
acontecimentos que se hão de seguir; um pretendente rico e elegante, cujo amor
é aceito pelo pai, mas rejeitado pela moça; enfim, os dois amantes à borda de
um abismo condenados a não verem coroados os seus legítimos desejos, e ao fundo
do quadro um horizonte enegrecido de dúvidas e de receios.
Depois disto, duvido que um só dos meus
leitores não me acompanhe até o fim desta história, que, apesar de tão comum ao
princípio, vai ter alguma coisa de original lá para o meio. Mas como convém que
não vá tudo de uma assentada, eu dou algum tempo para que o leitor acenda um
charuto, e entro então no segundo capítulo.
CAPÍTULO
2
Se o leitor já amou imagine qual não seria o
desespero de Ernesto, descobrindo um rival em Valentim. A primeira pergunta que
o pobre namorado fez a si mesmo foi esta:
— Amá-lo-á ela?
Para responder a esta pergunta Ernesto
preparou-se a averiguar o estado do coração da moça.
Não o fez sem algum despeito. Um sentimento
interior dizia-lhe que Valentim lhe era superior, e nesse caso suspeitava o
pobre rapaz que o triunfo coubesse ao rival intruso. Neste estado fez as suas
primeiras indagações. Ou fosse cálculo, ou natural sentimento, Clarinha, às
primeiras interrogações de Ernesto, mostrou que era insensível ao afeto de
Valentim. Nós podemos saber que era cálculo, apesar de me servir este ponto
para eu atormentar um bocado os meus leitores. Mas Ernesto viveu na dúvida
durante alguns dias.
Um dia, porém, convenceu-se de que Clarinha
continuava a amá-lo como dantes, e que portanto o iludido era Valentim. Para
chegar a esta convicção lançou mão de um estratagema: declarou que se ia matar.
A pobre moça quase chorou lágrimas de sangue.
E Ernesto, que tinha tanta vontade de morrer como eu, apesar de amar doidamente
a prima, pediu-lhe que jurasse que nunca amaria outro. A moça jurou. Ernesto
quase morreu de alegria, e pela primeira vez, apesar de serem primos, pôde
selar a sua paixão com um beijo de fogo, longo, mas inocente.
Entretanto, Valentim embalava-se nas mais
enganadoras esperanças. Cada gesto da moça (e ela os fazia por garridice)
parecia-lhe a promessa mais decisiva. Todavia, nunca Valentim alcançara um
momento que lhe permitisse fazer uma declaração positiva à moça. Ela sabia até
onde convinha ir e não dava um passo adiante.
Nesta luta íntima e secreta passaram-se
muitos dias. Um dia entrou, não sei como, na cabeça de Valentim que devia sem
prévia autorização pedir ao velho a mão de Clarinha. Acreditando-se amado, mas
supondo que a ingenuidade da pequena era igual à beleza, Valentim julgou que
tudo dependia daquele passo extremo.
O velho, que aguardava aquilo mesmo, armado
de um sorriso benévolo, como um caçador armado da espingarda à espera da onça,
apenas Valentim fez-lhe o pedido da mão da filha, declarou que aceitava a honra
que o moço lhe fazia, e prometeu-lhe, nadando em júbilo, que Clarinha aceitaria
do mesmo modo.
Consultada particularmente acerca do pedido
de Valentim, Clarinha não hesitou um momento: recusou. Foi um escândalo
doméstico. Interveio a tia, munida de dois conselhos e dois axiomas, para
convencer a rapariga de que devia aceitar a mão do rapaz. O velho assumiu as
proporções de semideus e atroava a casa; finalmente Ernesto exasperado
prorrompeu em protestos enérgicos, sem poupar alguns adjetivos mais ou menos
desairosos para a autoridade paternal.
Do que resultou ser o rapaz expulso de casa
pela segunda vez, e ficar assentado de pedra e cal que Clarinha casaria com
Valentim.
Quando Valentim foi de novo saber do
resultado do pedido, o velho afirmou-lhe que Clarinha consentia em aceitá-lo
por marido. Valentim manifestou logo um desejo legítimo de falar à noiva, mas o
futuro sogro respondeu-lhe que ela se achava meio incomodada. O incômodo era
nem mais nem menos resultante das cenas a que dera lugar o pedido de casamento.
O velho contava com a docilidade de Clarinha,
e não se iludia. A pobre menina, antes de tudo, acatava o pai e recebia as
ordens dele como se foram artigos de fé. Passada a primeira comoção, teve de
resignar-se a aceitar a mão de Valentim.
O leitor, que ainda anda à procura das
astúcias do marido, sem que ainda tenha visto nem marido, nem astúcias, ao
chegar a este ponto exclama naturalmente:
— Ora, graças a Deus! já temos um marido.
E eu, para furtar-me à obrigação de narrar o
casamento e a lua-de-mel, passo a escrever o terceiro capítulo.
CAPÍTULO
3
Lua-de-mel!
Há sempre uma lua-de-mel em todos os
casamentos, não a houve no casamento de Valentim. O pobre noivo viu na reserva
de Clarinha um acanhamento natural do estado em que ia entrar; mas desde que,
passados os primeiros dias, a moça não saía do mesmo propósito, Valentim
concluiu que havia enguia na erva.
O autor desta novela não se viu ainda em
situação igual, nem também caiu num poço de cabeça para baixo, mas acredita que
a impressão deve ser absolutamente a mesma.
Valentim fez o seguinte raciocínio:
— Se Clarinha não me ama é que ama alguém;
esse alguém talvez não me valha, mas tem sobre mim a grande vantagem de ser
preferido. Ora, esse alguém quem é?
Desde então a questão de Otelo entrou no
espírito de Valentim e fez cama aí: ser ou não ser amado, tal era o problema do
infeliz marido.
Amar uma mulher moça, bela, adorável e
adorada; ter a subida glória de possuí-la de poucos dias, à face da igreja, à
face da sociedade; viver por ela e para ela; mas ter ao mesmo tempo a certeza
de que diante de si não existe mais do que o corpo frio e insensível, e que a
alma vagueia em busca da alma do outro; transformar-se ele, noivo e amante, em
objeto de luxo, em simples pessoa oficial, sem um elo do coração, sem uma
centelha de amor que lhe dê a posse inteira daquela que ama, tal era a
miseranda e dolorosa situação de Valentim.
Como homem de espírito e de coração, o rapaz
compreendeu a sua situação. Negá-la era absurdo, confessá-la no interior era
ganhar metade do caminho, porque era saber o terreno que pisava. Valentim não
se deteve em suposições vãs; assegurou-se da verdade e tratou de descobri-la.
Mas como? Perguntar à própria Clarinha, era
inaugurar o casamento por uma desconsideração, e qualquer que fosse o direito
que tivesse de resgatar o coração da mulher, Valentim não queria
desprestigiá-la aos seus próprios olhos. Restava a pesquisa. Mas de que modo
exercê-la? À casa dele não ia ninguém; e demais, se alguma coisa havia, devera
ter começado em casa do pai. Interrogar o pai seria assisado? Valentim desistiu
de toda a investigação do passado e dispôs-se simplesmente a analisar o
presente.
A reserva de Clarinha não era uma dessas
reservas que levam o desespero ao fundo do coração; era uma reserva dócil e
submissa. E era exatamente isso o que feria o despeito e a vaidade de Valentim.
A submissão de Clarinha parecia a resignação do condenado à morte. Valentim via
nessa resignação um protesto mudo contra ele; cada olhar da moça parecia-lhe
anunciar um remorso.
Uma tarde...
O leitor há de ter achado muito singular que
eu não tenha marcado nesta novela os lugares em que se passam as diversas cenas
de que ela se compõe. É de propósito que faço: limitei-me a dizer que a ação se
passava no Rio de Janeiro. Fica à vontade do leitor marcar as ruas e até as
casas.
Uma tarde, Valentim e Clarinha achavam-se no
jardim. Se se amassem igualmente estariam àquela hora num verdadeiro céu; o sol
parecia ter guardado um dos seus melhores ocasos para aquela tarde. Mas os dois
esposos pareciam apenas dois conhecidos que por acaso se haviam encontrado num
hotel; ela por uma reserva natural e que tinha explicação no amor de Ernesto,
ele por uma reserva estudada, filha do ciúme e do despeito.
O sol morria numa das suas melhores mortes;
uma aragem fresca agitava mansamente as folhas dos arbustos e trazia ao lugar
onde se achavam os dois esposos o doce aroma das acácias e das magnólias.
Os dois estavam assentados em bancos de
junco, colocados sobre um chão de relva; uma espécie de parede composta de
trepadeiras formava por assim dizer o fundo do quadro. Perto ouvia-se o
murmúrio de um regato que atravessava a chácara. Finalmente duas rolas
brincavam a dez passos do chão.
Como se vê, a cena pedia uma conversação
adequada em que se falasse de amor, de esperanças, de ilusões, enfim, de tudo
quanto pudesse varrer da memória a boa prosa da vida.
Mas em que conversavam os dois? A descrição
fez-nos perder as primeiras palavras do diálogo; mal podemos pilhar uma
interrogação de Valentim.
— Mas, então, não és feliz? perguntou ele.
— Sou, respondeu a moça.
— Como dizes isso! parece que respondes a uma
interrogação da morte!
Um triste sorriso passou pelos lábios de
Clarinha.
Seguiu-se um breve silêncio, durante o qual
Valentim considerava as botas e Clarinha analisava a barra do vestido.
— Pois olha, não me falta vontade... disse
Valentim.
— Vontade de quê?
— De fazer-te feliz.
— Ah!
— Nem foi para outra coisa que eu te fui
buscar à casa de teu pai. Amo-te muito, mas se eu soubera que tu não
correspondias com o mesmo amor desistiria do meu intento, porque para mim é um
duplo remorso ver o objeto de meu amor triste e desconsolado.
— Parece-te isso!
— E não é?
— Não é.
Clarinha procurou dar a esta última resposta
uma expressão da maior ternura; mas se ela tivesse pedido um copo d’água teria
empregado a mesmíssima expressão.
Valentim respondeu com um suspiro.
— Não sei como queres que eu te diga as
coisas!
— Não quero nada; desde que eu te impusesse
um modo de falar pode ser que eu me arrufasse menos, mas não era diversa a
minha situação.
Clarinha levantou-se.
— Anda passear.
Valentim obedeceu, mas obedeceu
maquinalmente.
— Então, ainda estás triste?
— Ah! se tu me amasses, Clarinha! respondeu
Valentim.
— Pois não te... amo?
Valentim olhou para ela e murmurou:
— Não!
Valentim deu o braço a Clarinha e foram
passear pelo jardim, dos mais bem arrumados e plantados da capital; a enxada, a
tesoura e a simetria ajudavam ali o nascimento das rosas. A tarde caía, o céu
tomava essa cor de chumbo que inspira tanta melancolia e convida a alma e o
corpo ao repouso. Valentim parecia não ver nada disso; estava diante do seu
tremendo infortúnio.
Clarinha, por seu lado, procurava distrair o
marido, substituindo por algumas palavras de terno interesse o amor que lhe não
tinha.
Valentim respondia por monossílabos ao
princípio; depois a conversa foi-se empenhando e ao cabo de meia hora já
Valentim mostrava-se menos sombrio. Clarinha procurava por esse modo acalmar o
espírito do marido, quando ele insistia na conversação que ouvimos há pouco.
Uma coruja que acaba de cantar agora à janela
traz-me à memória que eu devia apresentar em cena neste momento a tia de
Clarinha.
Entra, portanto, a tia de Clarinha. Vem
acompanhada de um moleque vestido de pajem. A moça vai lançar-se-lhe aos
braços, e Valentim encaminha-se para ela com passo regular, para dar tempo às
efusões de amizade. Mas aquele mesmo espetáculo da afeição que ligava a tia à
sobrinha, a espontaneidade com que esta correra a receber àquela, mais o
entristecia, comparando o que Clarinha era há pouco e o que era agora.
Findos os primeiros cumprimentos entraram todos
em casa. A boa velha vinha passar oito dias com a sobrinha; Valentim fez um
gesto de desgosto; mas a moça manifestou uma grande alegria com a visita da
tia.
Valentim retirou-se para o seu gabinete e
deixou às duas plena liberdade.
À mesa do chá falou-se de muita coisa;
Clarinha indagava de tudo quanto era da casa do pai. Este devia vir no dia
seguinte jantar com o genro.
Valentim pouco falou.
Mas lá para o meio do chá, Clarinha voltou-se
para a tia e perguntou com certa timidez o que era feito de Ernesto. A moça
procurou dar à pergunta o tom mais inocente do mundo; mas tão mal o fez que
despertou a atenção do marido.
— Ah! respondeu a tia; está bom, isto é...
está doente.
— Ah! de quê? perguntou a moça empalidecendo.
— De umas febres...
Clarinha calou-se, pálida como a morte.
Valentim tinha os olhos fixos nela. Um
sorriso, meio de satisfação, meio de ódio, pairava-lhe nos lábios. Enfim o
marido descobrira o segredo da reserva da mulher.
Seguiu-se um longo silêncio da parte de
ambos, só interrompido pelo palavreado da tia, que afinal, depois de fazer
algumas perguntas aos dois sem obter resposta, decidiu-se a reclamar contra
aquele silêncio.
— Estamos ouvindo, minha tia, disse Valentim.
E tão significativas foram aquelas palavras,
que Clarinha olhou para ele assustada.
— Estamos ouvindo, repetiu Valentim.
— Ah! pois bem... Como ia dizendo...
A conversa continuou até o fim do chá. Às
onze horas todos se recolheram aos seus aposentos. É a melhor ocasião para
terminar o terceiro capítulo e deixar que o leitor acenda um novo charuto.
CAPÍTULO
4
A tia de Clarinha não se demorou oito dias em
casa da sobrinha, demorou-se quinze dias. A boa velha estava encantada com o
agasalho que encontrara aí.
Durante esse tempo não houve incidente algum
que interesse à nossa história. O primeiro susto de Clarinha causado pelas
palavras do marido desvaneceu-se à vista do procedimento posterior dele, que
pareceu nada haver descoberto. Com efeito, Valentim, como homem atilado que
era, entendeu que lhe não cumpria provocar uma declaração da parte de Clarinha.
Julgou melhor estudar a situação e esperar os acontecimentos. Demais, ele nada
tinha de positivo a alegar. Temia enganar-se e não se perdoaria nunca se
fizesse a injúria de atribuir à sua mulher um delito que não existia. Deste
modo, nunca fez alusão alguma nem mudou o procedimento; era o mesmo homem que
no primeiro dia.
Valentim pensava ainda que a afeição que ele
supunha existir em Clarinha pelo primo, talvez não passasse de uma ligeira
afeição da infância, própria a desaparecer diante da ideia do dever. É verdade
que isto anulava um pouco a sua própria pessoa, mas Valentim, para que não
ficasse só ao tempo e aos bons instintos da moça a mudança do estado das
coisas, cuidou de ajudar a um e aos outros deitando na balança a sua própria
influência.
Seu cálculo foi este: ao passo que Ernesto
perdesse no coração de Clarinha, graças à ausência e nobreza dos sentimentos
dela, ele Valentim procuraria ganhar a influência do outro e substituí-lo no
coração em litígio.
Estavam as coisas neste pé, quando no
quinquagésimo dia apareceu em casa de Valentim... quem? o próprio Ernesto, meio
enfermo ainda, cheio de uma palidez poética e fascinante.
Clarinha recebeu-o no jardim, por cuja porta
Ernesto entrou.
Teve um movimento para abraçá-lo; mas recuou
logo, corada e envergonhada. Baixou os olhos. Depois do casamento era a
primeira vez que se viam. Ernesto aproximou-se para ela sem dizer palavra, e
durante alguns minutos assim estiveram interditos, até que a tia veio pôr termo
ao embaraço, entrando no jardim.
Mas, ao mesmo tempo que aquela cena se dava,
Valentim, através dos vidros de uma das janelas da sala de jantar, tinha os
olhos pregados em Clarinha e Ernesto. Viu tudo, o movimento dela quando Ernesto
entrou e o movimento de reserva que se seguiu a esse. Quando a velha entrou
Valentim desceu ao jardim.
A recepção da parte do marido foi a mais
cordial e amiga; parecia que estava longe da cabeça dele a menor ideia de que
os dois se amavam. Foi essa a última prova para Clarinha; mas isso a perdeu
decerto, porque, confiada na boa fé de Valentim, entregou-se demasiado ao
prazer de tornar a ver Ernesto. Esse prazer contrastava singularmente com a
tristeza dos dias anteriores.
Não tenho o propósito de acompanhar dia por
dia os acontecimentos da família Valentim. Apenas me ocuparei com aqueles que
importarem à nossa história, e neste ponto entro já nas astúcias empregadas
pelo marido para libertar a mulher do amor que ainda parecia conservar pelo
primo.
Que astúcias foram essas? Valentim refletiu
nelas uma noite inteira. Ele tinha diversos meios para empregar: uma viagem,
por exemplo. Mas uma viagem não adiantaria nada; a ausência dava até mais
incremento ao amor. Valentim compreendeu isso e desistiu logo da ideia. Que
meio escolheu? Um: o ridículo.
Na verdade, o que há neste mundo que resista
ao ridículo? Nem mesmo o amor. O marido perspicaz compreendeu que era esse o
meio mais rápido.
Todavia, não tomou o ridículo senão naquilo
que ele é de convenção, naquilo que o mundo aceita como tal, sem que o seja
muitas vezes. Clarinha não podia resistir a esse. Era mulher como as outras.
Um dia, pois, estando reunida a família toda
em casa de Valentim, e com ela muitas visitas mais, o marido de Clarinha
convidou Ernesto, que se dava por cavaleiro perfeito, a ensaiar um cavalo que
havia comprado.
— Onde está ele?
— Chegou ontem... é um animal lindíssimo.
— Mas onde está?
— Vai vê-lo.
Enquanto se deram ordens de aparelhar o
cavalo, Ernesto dirigia-se às senhoras e dizia-lhes com ênfase:
— Desculpem se fizer má figura.
— Ora!
— Pode ser.
— Não acreditamos; há de fazer sempre boa
figura.
— Talvez não.
— Quer que o elogiemos?
Aparelhado o cavalo, saiu Ernesto a montá-lo.
Todos foram vê-lo do terraço.
O cavalo era um animal fogoso e manhoso.
Ernesto saltou para ele com certa graça e agilidade que adquiriu logo os
aplausos das damas, inclusive Clarinha.
Mal o cavalo sentiu o destro cavaleiro em seu
dorso, começou a pinotear. Mas Ernesto susteve-se, e com tanta graça que as
damas aplaudiram alegremente. Mas Valentim sabia o que fazia. Contava com o
resultado da cena, e olhava tranquilo o triunfo tão celebrado de Ernesto.
Esse resultado não se fez esperar. Não tardou
muito que Ernesto não começasse a sentir que estava mal. Tanto bastou para que
nunca mais pudesse dominar o animal. Este, como se pudesse conhecer o
enfraquecimento do cavaleiro e os desejos secretos de Valentim, redobrou a
violência dos seus movimentos. A cena tornou-se então mais séria. Um sorriso
que pairava nos lábios de Ernesto desapareceu; o moço foi tomando uma posição
grotesca quando só tinha presente a ideia de cair e não a ideia de que estava
diante de mulheres, entre as quais estava Clarinha. Por mal dos pecados, se
havia de cair como Hipólito, calado e nobre, começou a soltar uns gritos
entrecortados. As damas assustaram-se, entre elas Clarinha, que mal podia
dissimular o terror de que se achava possuída. Mas quando o cavalo, com um
movimento mais violento, deitou o cavaleiro na relva, e que, depois de cair prosaicamente
estendido, levantou-se sacudindo o paletó, houve uma grande gargalhada geral.
Então, Valentim, para tornar a situação de
Ernesto mais ridícula ainda, mandou chegar o cavalo e montou.
— Aprende, olha Ernesto.
E com efeito, Valentim, airoso e tranquilo,
sopeava os movimentos do animal e cumprimentava as senhoras. Foi uma tríplice
bateria de aplausos. Nesse dia um foi o objeto das palmas de todos, como o
outro fora o objeto da pateada geral.
O próprio Ernesto, que ao princípio quis
meter o caso à bulha, não pôde fugir depois à humilhação da sua derrota. Essa
humilhação foi completa quando Clarinha, mais compadecida que despeitada com a
situação dele, procurou consolá-lo da figura que fizera. Ele viu nas
consolações de Clarinha uma confirmação à sua derrota. E não está bem o amante
que inspira mais compaixão que amor.
Ernesto reconheceu por instinto esse
desastroso inconveniente; mas como remediá-lo? Curvou a cabeça e protestou não
cair noutra. E deste modo terminou a sua primeira humilhação como termina o
nosso quarto capítulo.
CAPÍTULO
5
Fazia anos o pai de Clarinha. A casa estava
cheia de amigos e parentes. Havia uma festa de família com os parentes e os
amigos para celebrar aquele dia.
Desde a cena do cavalo até o dia dos anos do
velho, já Valentim tinha armado a Ernesto mais dois laços do mesmo gênero, cujo
resultado era sempre expor o pobre rapaz ao motejo dos outros. Todavia, Ernesto
não atribuía nunca intenções malignas ao primo, que era o primeiro a
compungir-se dos infortúnios dele.
O dia do aniversário do sogro era para
Valentim um dia excelente: mas que fazer? que nova humilhação, que novo
ridículo preparar ao rapaz? Valentim, tão fértil de ordinário, não achava nada
naquele dia.
O dia passou-se nos folguedos próprios de uma
festa aniversária como aquela. A casa era fora da cidade. Folgava-se melhor.
À hora própria serviu-se um jantar
esplêndido. O velho tomou a cabeceira da mesa, entre a filha e a irmã;
seguiu-se Valentim e Ernesto, e o resto sem ordem de precedência.
No meio da conversa animada que acompanhou o
jantar desde o princípio, Valentim teve uma ideia e preparou-se para praticá-la
à sobremesa. Entretanto, correram as saúdes mais cordiais e mais entusiásticas.
Notou-se, porém, que Ernesto do meio do
jantar em diante ficara triste.
Que seria? Todos perguntavam, ninguém sabia
responder, nem mesmo ele, que teimava em recolher-se ao mais absoluto silêncio.
Valentim levantou-se então para fazer a saúde
de Ernesto, e pronunciou algumas palavras de entusiasmo cujo efeito foi fulminante.
Ernesto durante alguns minutos viu-se o objeto de aplausos que lhe valiam as
pateadas da montaria.
Uma coisa o perdeu, e nisto estava o segredo
de Valentim. Ernesto quis responder ao speech de Valentim. A tristeza que se
lhe notara antes era o resultado de uma desastrada mistura de dois vinhos
antipáticos. Forçado a responder por um capricho tomou o copo e respondeu ao
primo. Daí em diante era ele o iniciador de todas as saúdes. Quando ninguém
faltava para ser objeto dos seus speechs,
fez uma saúde ao cozinheiro, que foi extremamente aplaudida.
Descreverei eu as cenas que se seguiram a
esta? Fora entreter os leitores com algumas páginas repugnantes. Ernesto
excedera-se no entusiasmo, e quando todos se levantavam da mesa e tomavam o
caminho das outras salas, Ernesto desatou a chorar. Imaginem o efeito desta
cena grotesca. Ninguém pôde conter o riso; mas também ninguém pôde estancar o
pranto ao infeliz, que chorou ainda por espaço de duas horas.
CAPÍTULO
6
Uma noite havia reunião em casa de Valentim.
Era puramente familiar. Meia dúzia de amigos e meia dúzia de parentes formavam
toda a companhia. Às onze horas essa companhia estava reduzida a muito pequeno
número.
Armou-se (para usar da expressão familiar),
armou-se uma mesa de jogo em que Valentim tomou parte. Ernesto ao princípio não
quis, estava amuado... Por quê? Parecia-lhe ver em Clarinha uma frieza a que
não estava acostumado. Finalmente aceitou; mas procurou tomar lugar em frente
da mulher de Valentim; ela, porém, ou fosse por indiferença ou fosse adrede,
retirou-se para a janela com algumas amigas.
Abriu-se o jogo.
Em pouco tempo estavam os jogadores tão
animados que as próprias senhoras foram-se aproximando do campo da batalha.
Os mais empenhados eram Valentim e Ernesto.
Tudo estava observando um curioso, mas
tranquilo interesse, quando de repente Valentim para o jogo e diz para Ernesto:
— Não jogo mais!
— Por quê? perguntou Ernesto.
Um primo de Valentim, de nome Lúcio, olhou
igualmente para Ernesto e disse:
— Tens razão.
— Por quê? insistiu Ernesto.
Valentim levantou-se, atirou as cartas para o
lugar de Ernesto, e disse com um tom de desprezo:
— Por nada!
Lúcio e mais um dos presentes disseram:
— É caso de duelo.
Houve profundo silêncio. Lúcio olhou para
Ernesto e perguntou-lhe:
— Que faz o senhor?
— Que faço?
— É caso de duelo.
— Ora, isso não está nos nossos hábitos... o
que eu posso fazer é abandonar aquele senhor ao meu desprezo...
— O quê? perguntou Valentim.
— Abandoná-lo ao desprezo, porque o senhor é
um...
— Um... quê?
— O que quiser!
— Há de dar-me uma satisfação!
— Eu?
— Decerto, disse Lúcio.
— Mas, os nossos hábitos...
— Em toda a parte vinga-se a honra!
— Sou o ofendido, tenho a escolha das armas.
— A pistola, disse Lúcio.
— Ambas carregadas, acrescentou Valentim.
Durante este tempo as senhoras estavam
trêmulas e embasbacadas. Não sabiam o que se presenciava. Enfim, Clarinha pôde
falar, e as suas primeiras palavras foram para o marido.
Mas este parecia não atender a nada. Em
poucos minutos redobrou a confusão. Ernesto insistia contra o emprego do meio
lembrado para resolver a questão, alegando que ele não estava nos nossos
hábitos. Mas Valentim não queria, nem admitia outra coisa.
Depois de larga discussão admitiu Ernesto o
sanguinolento desenlace.
— Pois sim, venha a pistola.
— E já, disse Valentim.
— Já? perguntou Ernesto.
— No jardim.
Ernesto empalideceu.
Quanto a Clarinha, sentiu faltar-lhe a luz e
caiu desfalecida no sofá.
Aqui nova confusão.
Imediatamente prestaram-se-lhe os primeiros
socorros. Tanto bastou. No fim de quinze minutos ela voltava à vida.
Estava então no quarto, onde só havia o
marido e um dos convivas que era médico.
A presença do marido lembrou-lhe o que se
passara. Deu um leve grito, mas Valentim tranquilizou-a imediatamente, dizendo:
— Nada houve...
— Mas...
— Nem haverá.
— Ah!
— Foi brincadeira, Clarinha, foi tudo um
plano. O duelo há de haver, mas só para experimentar o Ernesto. Pois cuidas que
eu faria semelhante coisa?
— Falas sério?
— Falo, sim.
O médico confirmou.
Valentim contou que as duas testemunhas já se
entendiam com as duas do outro, tiradas todas dentre os que jogavam e que
entravam no plano. O duelo teria lugar pouco depois.
— Ah! não acredito!
— Juro... juro por esta bela cabeça...
E Valentim inclinando-se para a cama beijou a
testa da mulher.
— Oh! se tu morresses! disse esta.
Valentim olhou para ela: duas lágrimas
rolaram-lhe pelas faces. Que mais queria o marido?
Interveio o médico.
— Há um meio para crê-lo. Venham duas
pistolas.
Clarinha levantou-se e foi para outra sala,
que dava para o jardim e onde se achavam as outras senhoras.
Aí foram ter as pistolas. Carregaram-nas à
vista de Clarinha e dispararam depois, a fim de assegurar à pobre senhora que o
duelo era pura brincadeira.
Valentim desceu para o jardim. As quatro
testemunhas levaram as pistolas. As senhoras, prevenidas do que havia, ficaram
na sala, onde olhavam para o jardim, que foi iluminado de propósito.
Marcaram-se os passos e entregou-se a cada um
dos combatentes uma pistola.
Ernesto, que até então parecia alheio à vida,
mal viu diante de si uma arma, apesar de ter outra, mas tendo-lhe as
testemunhas dito que ambas se achavam armadas, começou a tremer.
Valentim apontou sobre ele. Ernesto fazia
esforços, mas não conseguia levantar o braço. Estava ansiado. Fez sinal para
que Valentim se detivesse, e tirou um lenço para enxugar o suor.
Tudo contribuía para assustá-lo, e de mais a
mais as seguintes palavras que se ouviam em roda:
— O que ficar morto há de ser enterrado aqui
mesmo no jardim.
— Está claro. Já se foi fazer a cova.
— Ah! que seja profunda!
Enfim, soaram as pancadas. À primeira Ernesto
estremeceu, à segunda caiu-lhe o braço, e quando lhe diziam que apontasse o
alvo para soar a terceira pancada, ele deixou cair a pistola no chão e estendeu
a mão para o adversário.
— Prefiro dar a satisfação. Confesso que fui
injusto!
— Como? prefere? disseram todos.
— Tenho razões para não morrer, respondeu
Ernesto, e confesso que fui injusto.
As pazes foram feitas.
Uma gargalhada, uma só, mas terrível, porque
foi dada por Clarinha, soou na sala. Voltaram todos para lá. Clarinha tomando
as pistolas, apontou-as para Ernesto e disparou-as.
Houve então uma gargalhada geral.
Ernesto tinha o rosto mais enfiado deste
mundo. Era um lacre.
Clarinha largou as pistolas e lançou-se nos
braços de Valentim.
— Pois tu brincas com a morte, meu amor?
— Com a morte, pelo amor, sim!
Ernesto arranjou daí a dias uma viagem e
nunca mais voltou.
Quanto aos nossos esposos, amaram-se muito e
tiveram muitos filhos.
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