As jacobitas
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Chegada há pouco do Oriente, onde
visitara, em companhia do esposo, alguns países exóticos, D. Margaridinha
descrevia aos seus vizinhos de mesa, no banquete oferecido ao casal pela
excelentíssima viúva Santos Soutelo, algumas curiosidades que mais lhe haviam
ferido a atenção.
— A coisa mais interessante que
eu assisti, — dizia, sorridente, enxugando com o guardanapo de linho os seus
polpudos lábios cor de cereja, — foi um costume dos jacobitas, seita religiosa
cujo mosteiro visitamos no Malabar.
As damas vizinhas descansaram o
talher para ouvir melhor, e D. Margaridinha, irrequieta e risonha, contou:
— Quando um jacobita se casa, o
seu primeiro cuidado consiste em ir ao templo no mosteiro, e pedir ao seu Deus
que lhe dê uma descendência numerosa e sadia, para maior esplendor da religião.
Feito isso, toma diversos pedaços de papel, escreve em cada um deles um nome de
homem ou de mulher, mete-os em um canudo de bambu que os sacerdotes lhe
oferecem, e, colocado a certa distância do ídolo, sopra o canudo, com toda
força. Impelidos assim, os papeluchos partem rodopiando e quantos caiam sobre o
altar, tantos serão os filhos que o casal deve ter!
— Esplêndido! — exclamaram as
senhoras, rindo. — Esplêndido!
À observação, porém, de uma que
lhe ficava mais próximo, a linda viajante objetou, jovial:
— Eu? Experimentei, sim!
E sem olhar para o marido, que a
fixava, severo, continuou:
— Alfredo tem, como não é
segredo, um desejo enorme de ter um filhinho. E é natural, coitado! Enquanto
estamos no vigor da idade, os filhos não nos fazem falta, porque viajamos,
passeamos, nos divertimos. Mas, depois, na velhice, é que se sente a tristeza,
o abandono, a solidão... Pensando nisso, nós fomos, um dia, no Malabar, ao
templo dos jacobitas.
— A senhora?
— Então? Era o último recurso,
filha! Chegando lá, Alfredo escreveu uma porção de nomes, bem uns cinquenta, em
outros tantos pedaços de papel, meteu-os no bambu e soprou com toda a força.
— E quantos caíram no altar? —
indagaram as senhoras, interessadas.
E madame:
— Nenhum, meninas, nenhum!
E explicou:
— Ele, na sua ansiedade, havia
posto papel demais no bambu, e...
— E...
— Entupiu o canudo!...
E soltou uma das suas gargalhadas
sonoras, altas, musicais, enquanto o marido, vermelho, se engasgava, a um
canto, com a sobremesa, à semelhança dos canudos do Malabar...
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