
As camisas
Pesquisa e atualização ortográfica: Iba Mendes (2017)
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Há muitos dias que o Dr. Abelardo
insistia com a mulher, a encantadora D. Sílvia, para que usasse umas camisas de
seda cor de rosa, que, na sua opinião, lhe deviam assentar admiravelmente sobre
a pele clara, macia, cetinosa. Apaixonada pelo marido, que sabia disputado pela
mais íntima das suas amigas, a loura Luizita Corrêa, D. Sílvia escancarou,
nesse dia, o grande móvel do quarto de vestir, em que guardava as suas roupas
de interior, e, tirando as dezenas de camisas que ali estavam arrumadas com
ordem, ia mostrando-as, uma a uma, ao esposo:
— É assim?
— Não.
— É dessas, de seda, enfiadas de
fita?
— Não.
— É assim, apenas com uma fita
sobre o ombro?
— Também não!
E como a esposa lhe não mostrasse
nenhuma camisa como a que ele desejava acariciar sobre o seu corpo soberbo,
convidou-a ele próprio, beijando-a nos olhos.
— Amanhã, na cidade, veremos onde
tem. Quero comprar-te uma dúzia. Ouviste, meu amor?
D. Sílvia agradeceu, com um
sorriso e um beijo, a gentileza amorosa do esposo e, no dia seguinte, à tarde,
entravam, os dois, contentes, em uma casa de modas da rua do Ouvidor, onde,
tomando a dianteira, o marido pediu:
— Camisas de dia, de seda, para
senhora; nº 3.
— Que cor? — indagou, solicita, a
moça que o atendeu.
— Cor de rosa.
A empregada subiu ao primeiro
andar, trouxe algumas caixas de camisas de seda, mas nenhuma correspondia ao
desejo elegante do freguês, que era, de fato, exigente.
— Não são destas? — consultou.
— Não, senhora. São mais finas,
mais transparentes, com uma renda de seda até quase à cintura.
— Ah! Já sei! — exclamou a
mocinha, sorrindo.
E, levantando os olhos para o
andar superior chamou por uma companheira.
— Julieta!
Apareceu, em cima, no balaustre,
a cabeça oxigenada de outra caixeira da casa.
— Manda-me dali, por favor —
pediu — a caixa de camisas nº 8.645.
E, particularizando, alto:
— Olha! daquelas que D. Luizita Corrêa
comprou aqui... Sabes?
Quando as camisas desceram das
nuvens, D. Sílvia tinha subido.
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