O Fascismo e o Pai dos Burros
O termo fascista transformou-se de uns tempos para cá numa verdadeira muleta
linguística na qual muitos se apoiam para atacar seus adversários, seja no
âmbito da política, seja por mera desavença ideológica. Simplificando: é "fascista" todo aquele que pensa diversamente a mim, que não partilha dos
meus ideais, que não segue a minha cartilha política, e por aí vai... O acadêmico
Leandro Karnal, por exemplo, numa de suas palestras denominou de
"fascistas" todos os leitores da revista Veja, obviamente pela vertente conservadora do periódico. Por sua
vez, o jornalista Reinaldo Azevedo, rotulou igualmente de "fascistas"
todos os admiradores do Deputado Jair Bolsonaro, claramente pela postura ultraconservadora
do referido político...
Em qualquer discussão banal,
especialmente na Internet, o adjetivo "fascista" torna-se
imprescindível, caracterizando a própria insensatez dos que dele fazem uso. Poucas
dessas pessoas conhecem de fato a origem do termo, seu sentido histórico, seus
aspectos ideológicos, conforme o seu respectivo contexto. Um simples dicionário
de Língua Portuguesa por si já é suficiente para lançar ao ridículo toda essa
panaceia vocabular. Segundo Houaiss, Fascismo
é um movimento político e filosófico ou regime (como o estabelecido por Benito
Mussolini na Itália, em 1922), que faz prevalecer os conceitos de nação e raça
sobre os valores individuais e que é representado por um governo autocrático,
centralizado na figura de um ditador.
Indo um pouco além da definição
meramente lexical, Robert O. Paxton, em seu livro "A Anatomia do
Fascismo", publicado pela Editora Paz e Terra, elenca uma pequena lista de
itens que caracterizavam as práticas fascistas. Ei-la:
1 - Um senso
de crise catastrófica, além do alcance das
soluções tradicionais;
2 - A primazia do grupo, perante o qual todos têm deveres superiores a qualquer direito, sejam eles individuais ou universais, e a subordinação do indivíduo a esses deveres;
2 - A primazia do grupo, perante o qual todos têm deveres superiores a qualquer direito, sejam eles individuais ou universais, e a subordinação do indivíduo a esses deveres;
3 - A crença de que o próprio grupo é vítima, sentimento esse que justifica qualquer ação, sem
limites jurídicos ou morais, contra seus inimigos, tanto internos
quanto externos;
4 - O
pavor à decadência dc grupo sob a
influência corrosiva do liberalismo individualista, dos conflitos de classe
e das influências estrangeiras;
5 - A necessidade de uma integração mais estreita no interior de uma comunidade mais pura, por consentimento, se possível, pela violência excludente, se necessário;
5 - A necessidade de uma integração mais estreita no interior de uma comunidade mais pura, por consentimento, se possível, pela violência excludente, se necessário;
6 - A
necessidade da autoridade de chefes naturais (sempre de sexo masculino),
culminando num comandante nacional, o
único capaz de encarnar o destino histórico do grupo;
7 - A superioridade
dos instintos do líder sobre a
razão abstrata e universal;
8 - A beleza da violência e a eficácia da vontade, sempre que voltadas para o êxito do grupo;
8 - A beleza da violência e a eficácia da vontade, sempre que voltadas para o êxito do grupo;
9 - O
direito do povo eleito de dominar os demais, sem restrições provenientes de qualquer tipo de lei humana ou divina, o direito sendo
decidido por
meio do critério único das proezas
do grupo no interior de uma luta darwiniana.
A forma como o termo é utilizado
hoje, especificamente aqui no Brasil, descaracterizou portanto sua significação original, equivalendo a qualquer palavra
de natureza pejorativa, por exemplo: corno, veado, vadia, canalha, imbecil,
ignorante, puta, coxinha, petralha etc. Como bem escreveu o genial Nelson
Rodrigues: cada época tem suas palavras encantadas. No tempo de Dumas velho,
era "cáspite". Ninguém sabe, até hoje, o que se esconde por trás de
"cáspite". Em nossos dias temos o famigerado "fascista", embora poucos dos que
dele fazem uso mal sabem o significado de "o pai dos burros".
É isso!
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Por: Iba Mendes (Março, 2017)
Por: Iba Mendes (Março, 2017)
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Referência bibliográfica:
Robert O. Paxton, em "A
Anatomia do Fascismo". Tradução: Patrícia Zimbres e Paula Zimbres.
Editora Paz e Terra. São Paulo, 2007.
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