"O Gigante egoísta", de Oscar Wilde
Conto infantil de Oscar Wilde, de uma tradução de 1939, publicado na revista "Eu Sei Tudo". Pesquisa, transcrição e adaptação ortográfica: Iba Mendes (2016)
Todas as tardes, quando saíam da escola as crianças costumavam ir brincar no jardim do Gigante. Era um formoso e imenso jardim, atapetado de grama verde e suave. Aqui e ali, entre as árvores muito altas, cresciam flores brilhantes como estrelas e havia plantas que, na primavera, floresciam em delicadas corolas de rosa aljôfar e que, no Outono, se carregavam de belas frutas. Os pássaros pousavam nas árvores e cantavam tão docemente que as crianças a todo momento suspendiam seus divertimentos para ouvi-los.
— Como tudo
aqui é bom e bonito! — costumavam exclamar, deliciados.
Todas as tardes, quando saíam da escola as crianças costumavam ir brincar no jardim do Gigante. Era um formoso e imenso jardim, atapetado de grama verde e suave. Aqui e ali, entre as árvores muito altas, cresciam flores brilhantes como estrelas e havia plantas que, na primavera, floresciam em delicadas corolas de rosa aljôfar e que, no Outono, se carregavam de belas frutas. Os pássaros pousavam nas árvores e cantavam tão docemente que as crianças a todo momento suspendiam seus divertimentos para ouvi-los.
Um dia, o
Gigante voltou. Tinha ido visitar seu amigo, o Ogre de Cornwailles, e com ele
permanecera sete anos.
Ao
chegar, viu as crianças brincando no jardim.
— Que
fazeis aqui? — vociferou, áspero e rubro de cólera, assustando terrivelmente os
pequeninos, que fugiram correndo.
— Meu
jardim é meu jardim! — continuou gritando. — Que todos saibam! A ninguém permitirei
que nele penetre e se divirta!
Com efeito,
ergueu uma elevadíssima muralha e nela pregou um cartaz: “É terminantemente proibida
a entrada, sob as consequentes penas!”
Era,
realmente, um gigante muito egoísta!
As pobres
crianças já não tinham onde brincar. Trataram de procurar distração na rua.
Esta, porém era cheia de poeira e semeada de rude cascalho. Não servia... Frequentemente
rondavam o alto paredão, relembrando as delícias do jardim, que havia além desse
obstáculo.
— Como
era bom e como éramos felizes! — diziam.
Quando
chegou a Primavera, toda a região se povoou de pássaros e se encheu de flores.
Só no jardim do Gigante egoísta reinava ainda o inverno. Os pássaros, como as crianças,
não cantavam e as árvores se esqueciam de florescer.
Certa
vez, uma formosa flor ergueu a cabeça dentre as plantas; porém mal viu o
cartaz, ficou triste, pensando nas crianças. Logo voltou a se esconder na
terra, tornando a adormecer. Os que se sentiam bem felizes eram a Neve e o
Granizo.
A
Primavera esqueceu este jardim - diziam jubilosas e nele vamos viver o ano
inteiro.
A Neve cobriu
a terra com seu grande manto branco e o frio pintou de prata as árvores.
Depois, convidaram o Vento do Norte... Que fosse passar uma temporada em sua
companhia!
E o Vento
do Norte compareceu. Vinha envolto em peles e esteve rugindo, todo o dia, através
do jardim, derrubando as chaminés.
— Que deliciosa paragem! — exclamou entusiasmado.
— Temos que prevenir o Granizo, para que também aproveite.
E o
Granizo surgiu. Todos os dias, durante três horas tocava seu tambor sobre os
telhados do castelo, até quebrar a maioria das telhas e vidraças, ao fim do que, dava voltas, tudo varrendo com violência. Chegara vestido de cor de cinza
e seu hálito era como gelo.
— Não compreendo
por que Primavera tarda tanto a chegar... — pensava o Gigante egoísta, quando
ousava se aproximar de uma janela, protegido por muitos cobertores e via seu
jardim completamente branco. — Mas o tempo há de mudar, breve!
Porém a
Primavera não apareceu nunca mais, nem o Verão. O Outono deu frutos dourados a
todos os pomares e jardins, porém o jardim do Gigante não viu um só sequer.
— É
demasiado egoísta! dizia o Outono.
Assim, ali,
sempre foi Inverno, enquanto o Vento do Norte, o Granizo, Chuva e a Neve dançavam
continuamente entre as árvores.
Uma manhã,
estava o Gigante ainda na cama, quando ouviu música, sumamente agradável. Tão meigamente
soava em seus ouvidos, que pensou ser o rei dos músicos quem passava. Na
realidade, era apenas um pardal que piava junto de sua janela. Porém havia
tanto tempo que ouvia cantar um pássaro em seu jardim, que aquela simples sucessão
de pios lhe pareceu a música mais bela do mundo. Então, o Granizo suspendeu sua
infernal dança e o Vento do Norte cessou de rugir. Logo um delicioso perfume
entrou pelas madeiras rachadas e as vidraças partidas.
— Parece que
enfim chegou a Primavera — disse o Gigante; e, saltando da cama, correu a uma janela.
E viu um maravilhoso
espetáculo. Através de uma brecha da muralha as crianças vinham e já estavam trepadas
nas árvores. Em cada árvore havia um menino e as árvores se sentiam tão
contentes, tendo-os novamente entre seus ramos, que se cobriram de flores e, suavemente,
com cuidado, balançavam seus braços sobre as cabecinhas infantis. Os pássaros, inúmeros,
voavam, cantando com alegria e as flores surgiam
radiosas entre as plantas novamente verdes e macias. Apenas num cantinho
reinava ainda o Inverno. Era o mais apartado recanto do jardim e nele se achava
um menino. Era tão pequeno que não alcançava os
ramos das árvores e volteava junto delas chorando amargamente.
A pobre árvore
ainda se achava completamente coberta de granizo e de neve e o Vento do Norte soprava, rugindo contra ela.
— Sobe,
menino! — dizia a árvore — e baixava seus ramos, tudo o que era possível. Mas o
menino era realmente muito pequenino...
O Gigante
sentiu derreter o próprio coração, enquanto olhava.
— Quão
estúpido fui! — exclamou com voz rouca e difícil. — Sei agora porque a
Primavera recusava aparecer. Eu ajudarei esse pobre menino a subir; depois
derrubarei a muralha e meu jardim será para sempre o lugar de brincadeira das crianças.
Desceu
correndo a escada, abriu com cuidado a porta principal e se embrenhou pelo
jardim.
Porém,
quando o viram aparecer, as crianças tomaram tão grande susto que correram
atropeladamente e o jardim ficou de novo sob os caprichos do Inverno. Somente o
pequenino, o menor de todos, não fugiu, pois seus olhos estavam tão cheios de lágrimas
que ele não viu a chegada do Gigante. Este se aproximou e, levantando-o suavemente
entre os braços, colocou-o no galho mais confortável. Logo a árvore floresceu e
os pássaros a encheram, cantando. Então o pequenino lançou os braços em redor
do poderoso pescoço do Gigante e beijou-o. Quando os outros meninos viram que o
gigante não era mau, voltaram correndo e com eles voltou a Primavera.
— O
jardim desde hoje é vosso... — disse o Gigante. E empunhando um tremendíssimo
machado, derrubou o muro.
O dia
todo, as crianças brincaram, enchendo o jardim com seus risos cristalinos no
louco zigue-zague de suas correrias. Quando anoiteceu foram se despedir do
Gigante.
Mas onde
está o menino pequeno? — perguntou o Gigante, impaciente e assustado. — Aquele,
que eu ajudei a subir na árvore? Onde está o garotinho?
O Gigante
o queria mais do que aos outros, porque ele o beijara.
— Não
sabemos — responderam os meninos. — Já foi...
— Dizei-lhe
que volte amanhã pediu o Gigante.
Porém os
meninos explicaram que não sabiam onde ele morava e que nunca o tinham visto
antes; então o Gigante ficou muito triste.
Todas as
tardes, ao sair da escola, os meninos iam brincar no jardim. Porém o pequenino,
que o Gigante mais queria, não voltou a aparecer. O Gigante era muito bom para
todas as crianças, mas não podia esquecer seu amiguinho.
— Quanto
me alegraria se voltasse! — costumava repetir.
Passaram
os anos. O Gigante envelheceu e suas forças enfraqueceram. Já não podia tomar
parte nos divertimentos dos meninos. Sentado em enorme poltrona, ficava observando
suas brincadeiras para que não se excedessem e se machucassem, quando corriam
por seu belo jardim.
***
Numa
manhã de inverno, olhou pela janela, enquanto se vestia. Já não odiava o
Inverno, pois sabia que era tão somente a Primavera adormecida e que as flores
estavam descansando.
Repentinamente
esfregou os olhos deslumbrado e olhou mais uma vez...
Era
certamente maravilhoso o que via. No recanto mais afastado de seu jardim, havia
uma árvore totalmente coberta de flores brancas. Seus ramos eram dourados, frutos
de prata pendiam deles e... e junto dele, de pé, estava o pequenino que ele
tanto estimava!
Cheio de
alegria, desceu correndo as escadarias, chegou ao jardim e quando se aproximou
do menino, seu rosto enrubesceu de cólera. Com voz sufocada pela emoção,
perguntou:
— Quem se
atreveu? Quem se atreveu a te ferir assim?
Porque nas palmas das mãos do menino havia os rasgões de dois pregos, como de pregos eram
os dois rasgões de seus pezinhos.
— Quem se
atreveu a te ferir assim? tornou a gritar. — Dize-me para que eu o mate!
— Não!
respondeu o menino. — Estas são as feridas do Amor.
— Quem és
tu? — perguntou o Gigante. E um estranho temor se apoderou dele, fazendo-o
dobrar os joelhos diante do pequenino.
O menino
sorriu e disse:
— Tu me
deixaste, uma vez, brincar em teu jardim; hoje brincarás comigo em meu jardim,
que é o Paraíso.
E quando
os meninos voltaram, naquela tarde, encontraram o Gigante morto, debaixo da árvore,
todo coberto de flores brancas.
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